sexta-feira, 16 de abril de 2010

Audiência pública comprova falta de estrutura do poder público para enfrentar o problema

Não por acaso o Rio de Janeiro conquistou o título de campeão do trabalho escravo no país, no ano passado.Pudera. Há apenas três fiscais para atuar em quatro municípios do Norte Fluminense, nos latifúndios explorados pelas usinas canavieiras. Essa foi a principal denúncia apresentada na audiência pública da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Alerj, realizada hoje(16), em Campos dos Goytacazes, para identificar responsabilidades e apontar saídas para o quadro de superexploração dos trabalhadores rurais. Pelo menos 300 pessoas participaram ou acompanharam a audiência.
O trabalhador rural P.R. contribuiu na audiência com um relato emocionado do tempo em que trabalhou duramente, por 32 anos, na Usina Cupim, pertencente ao Grupo Othon. Não bastasse as condições de vida no canavial, veio a demissão, em 2007, sem que tenha recebido até hoje da empresa nada a que teria direito. Essa é a realidade de cerca de 3 mil trabalhadores rurais desempregados no Norte Fluminense. A vida dos 12 mil homens e mulheres em atividade nos canaviais e usinas da região não fica atrás em desrespeito aos direitos humanos e trabalhistas.
"Está claro porque o Rio alcançou tamanho índice de casos de trabalho escravo. Com tão poucos fiscais, fica impossível impedir a exploração criminosa dos trabalhadores rurais. Também fica evidente que toda essa falta de estrutura da fiscalização ocorre de propósito", disse o presidente da Comissão de Direitos Humanos. "Essa falta de fiscalização beneficia diretamente a manutenção da já histórica concentração de terras e rendas nas mãos de poucos, com, inclusive, nessa região, o maior número de sem-terras do estado e, em consequência, a maior quantidade de conflitos rurais", acrescentou.
Na audiência, decidiu-se pela criação de um Grupo de Trabalho com representantes do Ministério Público Federal, Estadual, do Trabalho e Inea, com o fim de apurar o destino das denúncias já existentes e identificar as responsabilidades em cada caso. Também será enviado ofício para o Ministério do Desenvolvimento Agrário, com a recomendação de desapropriação das terras pertencentes ao Grupo Othon, para o pagamento das dívidas trabalhistas acumuladas pela empresa. Essas terras estão completamente inativas, portanto, não cumprem a sua função social conforme exige a Constituição.
Outra deliberação foi a inclusão da pauta do trabalho escravo na revisão do Plano Estadual de Direitos Humanos, com base no resultado de seminário, a ser realizado em maio, para elaboração de um novo texto para o plano. Além disso, houve a proposta de realização de uma das etapas do seminário em Campos, com a participação da Secretária Estadual de Ação Social e Direitos Humanos, assim como a da realização de nova audiência pública na Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal dos Deputados.
O Estado do Rio de Janeiro em 2009 registrou o maior índice de trabalho escravo do país. Segundo o Ministério Público, foram realizadas cinco operações entre maio e novembro. O título se deveu à situação constatada em Campos em unidade da empresa Agrisul (Companhia Brasileira de Açúcar e Álcool), do Grupo J. Pessoa. Na usina, 552 trabalhadores foram resgatados da escravidão. O plantio de cana, matéria-prima para a produção de açúcar e álcool, respondeu por todas as situações de trabalho análogo ao de escravo no Rio.
Participaram da audiência da Comissão de Direitos Humanos, além de representantes do poder público estadual e federal, militantes do Movimento dos Sem-Terra (MST), da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e do Comitê contra o Trabalho Escravo.

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